Um decreto que respeita a decisão da sociedade brasileira

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Um dos pilares da campanha do presidente da República Jair Bolsonaro, então candidato durante a corrida presidencial no ano de 2018, foi a flexibilização do porte e da posse da arma de fogo. E assim publicou nesta semana o Decreto nº 9785, que regulamenta a lei nº 10.826/03 – mais conhecida por estatuto do desarmamento.

Questionado perante o Supremo Tribunal Federal por determinados partidos políticos, fato é que o decreto apenas respeitou o que a sociedade brasileira decidiu no referendo realizado no ano de 2005 – o que o governante à época não o fez. Ao contrário, a lei e a decisão da maioria dos cidadãos através do decreto 5123.

A ideologia pregada à época logo contaminou as instituições da República, deixando o cidadão de bem, que votara pela manutenção do comércio de armas no Brasil, totalmente à mercê da vontade de agentes públicos que, sem qualquer critério padronizado, vetava-lhe em regra a posse ou o porte de arma.

A lei 10.826/03, estatuto do desarmamento, estabelece que em regra é proibido o porte de arma de fogo. Porém esta mesma lei confere o porte de arma a determinadas classes e carreiras, como policiais, agentes prisionais, seguranças do poder judiciário, auditores da receita federal, entre outros. Um pequeno rol de beneficiados.

Mas esta mesma lei permite, segundo seu artigo 10, que qualquer outro cidadão, ainda que não exerça cargo público, mas que esteja exposto a risco ou segurança de sua integridade em razão de exercício profissional seja autorizado a portar arma para sua defesa. E então um delegado federal recebia a documentação e analisava caso a caso. A negativa era a regra.

E aqui surge o decreto nº 9785 editado nesta semana, pois o mesmo terminou retirando desta autoridade um poder de avaliar caso a caso e assim tratar por vezes de forma desigual casos idênticos. Por exemplo: supondo que dois oficiais de justiça apresentassem a devida documentação e exames psicológicos para requerer o porte de arma, certamente teriam resultados diferentes.

Já sob a vigência deste decreto regulamentar, uma vez aprovado no exame psicológico e de capacidade de manuseio da arma, terá autorizado o porte, visto que o Estado reconheceu que aquela classe de trabalhador está exposto a risco. Não se conferiu o direito de trabalhar ostensivamente armado, mas de o trabalhador portar de forma discreta uma arma para se defender.

É ainda uma economia e otimização de recursos públicos, visto que poupará a autoridade de analisar cada pleito individualmente, evitando também até interposição de recursos em virtude de uma decisão denegatória. Enfim, é a perfeita materialização do princípio da eficiência na administração pública. Princípio este constitucional.

O decreto abrange, por exemplo, profissões extremamente expostas a riscos que sempre foram ignoradas pelo Estado, tal como os caminhoneiros. Quem não conhece a vida e a rotina de um profissional do volante jamais poderia opinar através de achismo se a profissão oferece ou não risco.

Enquanto os ditos experts debatem, por exemplo, se a rotina de um caminhoneiro é perigosa para merecer portar uma arma, este profissional repousa dentro da cabine do seu caminhão só aguardando a sua vez de ser abordado pelo marginal, que atua sem qualquer piedade em busca de uma vantagem patrimonial.

É importante sempre ter em mente que o indivíduo de má-fé não precisa percorrer uma via crucis para obter e portar uma arma de fogo. Ele inclusive já o faz no atual cenário, ficando apenas os bons cidadãos desarmados, impedidos de exercerem a legítima defesa. Ou seja, o marginal tem a certeza que a maioria esmagadora da sociedade não tem como se defender de sua agressão ou ameaça. Por isso age livremente.

Portanto não achemos que se trata de um reconhecimento da falência da segurança pública. Ao contrário, trata-se de uma concretização de promessa de campanha – e também por este motivo o atual presidente fora eleito – que visa respeitar o que a sociedade decidiu em referendo realizado anos atrás. A medida não visa atribuir ao cidadão o papel de exercer segurança pública. Mas tão apenas se defender.

O código penal brasileiro diz, entre outros, que se o sujeito pratica o ato em legítima defesa, não é considerado crime. Ou seja, grosseiramente falando, significa dizer que se o cidadão ao se defender de uma agressão terminar matando outrem, não será considerado crime.

Como um cidadão irá exercer a sua legítima defesa contra a agressão ou ameaça de alguém que esteja armado? No mínimo estando também armado. Mas o estado brasileiro, através da ideologia dolosamente pregada nos últimos anos, impede que o cidadão se defenda. Chega a ser paradoxal o legislador permitir que o cidadão retire a vida de outrem caso sofra agressão e por outro lado impedir que o mesmo tenha os mesmos recursos do seu agressor.

Não precisa ser conhecedor da lei ou da ciência para saber que o maior bem de uma pessoa é a vida. Qualquer animal, ao se sentir ameaçado, reagirá a fim de proteger a sua integridade e a sua vida. E assim, entre a vida de alguém de bem e a de alguém que escolheu voluntariamente o caminho torto, que prevaleça aquela.

Portanto se democracia e o estado democrático de direito existir de fato nesta terra, espera-se que as instituições – poder legislativo e judiciário – não retrocedam e sustem o referido decreto nº 9785, uma vez que está dentro do seu poder regulamentar e apenas concretizou um anseio da maioria dos cidadãos que elegeu o atual presidente.

Foto de Raphael Junqueira

Raphael Junqueira

raphaelfjd@terra.com.br 

Advogado e servidor público, pós graduado em direito penal e em gestão e normatização de trânsito e transporte.


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