Bernardo, o menino que morreu por atrapalhar a ambição de um romance
11/03/2019 às 19:59 Ler na área do assinanteEra para estar completando 16 anos e tirando o título de eleitor e pensando qual seria a sua profissão
Bernardo merece justiça. Mas é tão triste que um menino de 11 anos, assassinado em 2014, tenha que torcer para a condenação do pai e da madrasta. Tenha que rezar lá do céu para a prisão da família.
Ele que nunca teve ninguém, a não ser a mãe falecida antes dele.
Ele que morreu sozinho, não entendendo o motivo do ódio que recaía sobre ele, já que não fez nada de errado na escola e em casa.
E só aceitou o passeio de sua morte, porque esperava ganhar uma televisão. Foi ludibriado até o fim. Até o fim, torturado pela esperança.
Um menino com as mesmas roupas de sempre, com uma pobreza franciscana (todos estranhavam um filho de médico andando daquele jeito), carente de olhares mais fundos e preocupados, procurando explicações no Fórum porque não merecia atenção, porque não era amado como tantos outros colegas de Três Passos (RS).
Um menino alegre e puro que foi posto fora do mundo pelos seus responsáveis. Descartado como um objeto indesejável, por não pertencer aos planos de um casal, por atrapalhar a ambição de um romance.
Um menino arremessado numa cova às margens de um rio em Frederico Westphalen (RS), coberto por um saco plástico quando deveria estar na cama, com o cobertor até o queixo, acarinhado pelos seus cuidadores para não passar frio de noite.
Um menino lindo que perdeu a paz da infância. Era para ter infância e não teve. Virginiano de 6 de setembro, era para estar completando 16 anos e tirando o título de eleitor e pensando qual seria a sua profissão. Era para ter um futuro, uma vida pela frente para compensar as humilhações e dores sofridas em silêncio, mas o que restou de sua biografia foram nove mil páginas de um processo, distribuídos em 44 volumes, onde o pai seria o mandante do crime e a madrasta, a articuladora.
Uma cidade inteira respira debaixo da terra desde aquele 14 de abril.
(Texto de Fabrício Carpinejar. Publicado originalmente no site Gaúcha ZH)