O ex-governador Sérgio Cabral e o engenheiro Paulo Vieira de Souza, mais conhecido como Paulo Preto, estão presos. E já condenados. Ou melhor, severamente condenados. O primeiro conquistou 197 anos de prisão decorrentes de oito sentenças criminais. O outro cravou uma proeza: em uma semana, foi duas vezes condenado a penas que, somadas, totalizam 172 anos. É, sem dúvida, um bocado de cadeia.
Cabral, com 56 anos, boa parte deles surrupiando o erário público e aniquilando com a dignidade e o orçamento dos cariocas, estaria negociando delações e fazendo confissões. Semana passada, na presença do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, pedindo desculpas por ter mentido nos depoimentos anteriores e se dizendo “aliviado”, admitiu amealhar propinas por apego ao poder e ao dinheiro. Na sequência do seu interrogatório, definiu este seu comportamento como “um vício” e aproveitou para incriminar antigos auxiliares, empresários e parlamentares. Entregou-os direto, sem gaguejar, e detalhando os percentuais de propina que cada um dava, ou pedia ou levava.
Preto, que se tornou septuagenário no dia seguinte à sua segunda condenação, fixada em exemplares 145 anos de reclusão, estaria sendo pressionado por seus familiares para delatar o esquema de corrupção que envolveria figuras nacionais do PSDB, fundamentalmente porque uma das suas filhas foi condenada, na mesma ação penal, a mais de 24 anos de prisão. Na prática, são duas gerações encarceradas, o que gera duplo sofrimento para quem ficou do lado de fora e visita ambos na cadeia.
Certamente esses dois personagens do mundo do crime, mesmo a partir dos presídios onde estão (e de onde custarão a sair), podem acrescentar novos capítulos na história desta República dizimada por cretinos. Suas confissões ou delações seriam de extrema valia para fomentar novas investigações em torno daqueles que se apossaram dos poderes públicos. Tais narrativas, previsivelmente repugnantes em termos de tramas e desvios, conduziriam à identificação de outros envolvidos em esquemas de corrupção, tráfico de influência, formação de quadrilha e por aí vai.
Na sequência, o ex-governador viciado em propinas aproveitou o seu momento de psicanálise forense e comentou sobre integrantes do MP/RJ e um membro do Superior Tribunal de Justiça por ele supostamente promovido a pedido de outro presidiário, coincidentemente cunhado deste ministro, e que por pouco não foi senador. O magistrado já retrucou Cabral por meio de nota oficial. De outra parte, uma soltura anterior de Preto, após ser rastreada a partir de extratos de ligações e mensagens eletrônicas, ensejou um bem fundamentado pedido de suspeição ou impedimento firmado por 14 abnegados integrantes do Ministério Público Federal (Ofício nº 1691/2019 – PRPR) encaminhado à Procuradora Geral da República relativamente a um douto ministro do Supremo Tribunal Federal, aliás, órgão máximo do Judiciário brasileiro e único pretório do país que não dispõe de Corregedoria.
Se considerarmos que esses fatos públicos, concretos e amplamente noticiados pelos meios de comunicação se desdobraram com tamanha intensidade e conteúdo em apenas dez dias, é possível imaginar a letalidade de seus depoimentos oficiais perante autoridades objetivando alcançar privilégios processuais de modo a suavizar as suas longas penas. E se há um ponto em que gregos e troianos estão de acordo é no que isso pode significar em termos de, digamos, “qualidade de vida” para quem está trancafiado numa cela, dormindo em colchonete e pedindo autorização para ir ao banheiro ou ler uma revista. Neste sentido, sobram exemplos e falta espaço para arrolar os casos mais recentes.
Por fim, é óbvio que tudo isso pode significar o combustível que faltava para a concretização da tão aguardada Lava Toga que vem mobilizando os esforços do combativo senador Alessandro Vieira (PPS/SE). Para esta CPI, ninguém quer sangue e vingança, mas a apuração de fatos. Caso seja instalada, a mesma tende a ser profunda. Os pronunciamentos do parlamentar sergipano nas sessões de 14 e 21 de fevereiro passado, assim como os apartes ocorridos, já deram o tom da empreitada.
Portanto, não resta outra coisa aos brasileiros senão pedir:
- Cabral e Preto, por favor, falem!
Antônio Augusto Mayer dos Santos
Advogado e professor de Direito Eleitoral