Crises políticas e a renúncia de Jânio: Parece que foi ontem

03/10/2015 às 21:23 Ler na área do assinante

As crises políticas acompanham a história do Brasil não é de hoje. 

Chegava ao fim o governo desenvolvimentista  de Juscelino Kubitscheck em 1960, marcado pelo crescimento do parque industrial brasileiro, em especial, do setor automobilístico. Foi também o ano da inauguração, em 21 de abril, da nova capital, Brasília. Mas, o que realmente aconteceu foi o início de uma grave ruptura no processo democrático, aparentemente tranquilo com as eleições presidenciais de 3 de outubro e com a vitória estrondosa de Jânio Quadros.

Seu governo duraria apenas 7 meses.

Professor de português, político populista, Jânio obteve 48% dos votos, deixando em segundo lugar o general Henrique Teixeira Lott, com 32% dos votos e, em último, outro político populista, Adhemar de Barros com 20% dos votos. O principal argumento da campanha foi o combate à corrupção (problema recorrente que parece não ter fim na nossa história), usando como símbolo uma vassoura. A música (o jingle de campanha) era um primor de marketing: “varre, varre vassourinha, varre, varre a bandalheira...” e assim por diante. Aliás, uma mensagem ainda muito atual. 

Os detalhes interessantes nessas eleições foram os candidatos a vice, pois recebiam uma votação separada conforme as regras da ocasião. Desse modo, o candidato a vice de Jânio, Milton Campos, ficou em segundo lugar e o vice de Lott, João Goulart (Jango), saiu-se vitorioso.

Nessa campanha Jânio passou por Campo Grande, momento em que mais uma vez se discutia a divisão do estado de Mato Grosso. Na ocasião foi apresentado ao candidato um cartaz com o mapa do estado sendo cortado ao meio por uma tesoura. Para a decepção dos divisionistas, Jânio manifestou-se contrário à proposta sulina. Segundo fontes orais, Jânio teria dito que a tesoura cortava o seu coração.

Em 31 de janeiro do ano seguinte, Jânio e Jango tomaram posse no novo palácio do governo em Brasília. Durou pouco e ainda foi marcado por crises e trapalhadas que, para o espanto de todo o país,  resultou na bombástica renúncia do seu mandato de presidente da república.

É bom lembrar que Jânio era campo-grandense, apesar de seus pais morarem em Miranda. Nas vésperas de seu nascimento, sua mãe, Leonor da Silva Quadros, por falta de condições adequadas de acompanhamento médico em sua cidade,  foi transferida para Campo Grande, onde Jânio viveu os seus primeiros trinta dias de vida. Nasceu na rua 14 de julho, em frente ao prédio onde mais tarde funcionou a Casa Nasser, sendo  registrado no Cartório do 2º Ofício de Waldir Santos Pereira. Em Miranda, Jânio viveu os primeiros anos de sua infância.

Com a sua renúncia, seu sucessor legal, João Goulart, que estava em viagem oficial pela China, foi impedido de assumir a presidência pelos ministros militares. Com isso, o país ficou a beira de uma guerra civil, somente evitada com a conciliação das forças em conflito, tendo como solução a implantação do parlamentarismo. Somente assim Jango conseguiu assumir a presidência. Essa experiência parlamentarista, entretanto, durou pouco, com a volta do presidencialismo através do plebiscito de 2 de janeiro de 1963.   O governo de Jango aproximou-se de uma esquerda democrática, mas o avanço das suas reformas de base foi interrompido pelo golpe militar de 1964, que mergulhou o país numa longa e tenebrosa ditadura. 

Foi no período ditatorial que mais uma vez Jânio teve a sua história relacionada ao  sul do estado de Mato Grosso, ao ser confinado em 1968 na cidade fronteiriça de Corumbá. A permanência do ex-presidente na cidade foi um acontecimento a parte. Foi, na verdade, uma grande festa para os corumbaenses que o receberam como  celebridade. O curioso de tudo isso foi que, ao retornar a São Paulo, Jânio não pagou nenhuma de suas contas de estadia e despesas pessoais no Hotel Santa Mônica, alegando que era “hóspede” do  governo militar. Assim, o antigo proprietário do Santa Mônica, Netinho, amargou o prejuízo de toda essa lambança, ficando como recordação histórica a nota fiscal não quitada.

Bem mais tarde, nas semanas que antecederam o envio, pelo presidente Geisel, ao Congresso Nacional da Lei Complementar que criou o estado de Mato Grosso do Sul, Jânio Quadros voltou a assombrar os campo-grandenses com uma carta, agora apoiando a criação do novo estado. 

O oportunismo de Jânio não foi, entretanto, bem visto pelos divisionistas de Campo Grande. Mas, aí começou uma outra história.....

Valmir Batista Corrêa

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Valmir Batista Corrêa

É professor titular aposentado de História do Brasil da UFMS, com mestrado e doutorado pela USP. Pesquisador de História Regional, tem uma vasta produção historiográfica. É sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico de MT, sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de MS e membro da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras.

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