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Caso João de Deus: prender para investigar depois, nunca. Que se dê habeas corpus para o médium

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Darcy Arruda Miranda e Freitas Nobre, dois notáveis comentaristas da revogada Lei de Imprensa, diziam, num paralelo de todo procedente, que a Imprensa é o 4º poder do Estado. No início da minha carreira de advogado, mais de 40 anos atrás, a expressão me impressionou. Mas hoje o 4º poder do Estado é mesmo a TV Globo, emissora de muitos méritos, mas quando quer derrubar alguém, derruba mesmo.

Neste triste episódio do médium João de Deus, só se ouve, só se colhe e só se vê depoimentos de pessoas que se dizem vítimas do médium. Creio nos seus depoimentos. Mas por que não se colhe, também, depoimentos de pessoas que foram curadas pelo dom deste homem? Pessoas agradecidas pelo bem que ele já fez ao próximo? E mais outra pergunta, de muitas que atravessam minha garganta: por que a Justiça decretou a prisão preventiva (nem provisória é) de João de Deus?

Decretou-se a prisão para investigar depois. Não, não concordo. Se 5% dos depoimentos forem verdadeiros e os crimes não estiverem prescritos e forem corretamente comprovados, ele como pessoa humana é um nojento criminoso abjeto. Cometeu crimes literalmente hediondos e imundos. É um porco. Mas que se dê a ele, mesmo porco, mesmo nojento, mesmo imundo e covarde, que se dê a ele o sagrado direito de defesa.

Sem nunca ter sido ouvido, a Justiça foi logo mandando o ancião para o cárcere. Nem prisão domiciliar teve direito. Nem liberdade vigiada foi-lhe concedida. A ordem é prendê-lo e colocá-lo no xadrez. E já.

Prisão preventiva se decreta para garantia da ordem pública (não se tem notícia de que João esteja colocando em risco a ordem pública). Para a garantia da ordem econômica (idem, sem risco algum). Por conveniência da instrução criminal e para assegurar a aplicação da lei quando houver prova da existência do crime e indício suficiente da autoria (artigo 312 do C.Penal).

Então, recorra-se ao bordão "pesos e contra-pesos" e daí o rebate: qual o inconveniente de manter João de Deus em liberdade no curso da investigação, que mal começou? Qual o risco que João de Deus oferece para, no final de um demoradíssimo processo com instrução criminal congestionada e de muitas diligências - e caso venha ser condenado -, João de Deus não cumpra a pena que eventualmente venha-lhe ser imposta?

Senhor Juiz, o que João de Deus disse à Polícia, ao Ministério Público, a Vossa Excelência? Se disse algo, quando foi que o depoimento ou depoimentos aconteceram e foram tomados? Todo cuidado é pouco. O país inteiro sabe o que aconteceu com o caso da Escola-Base em São Paulo. Se João de Deus já estiver preso, ou mesmo que ainda não esteja, que o Tribunal de Justiça de Goiás lhe dê Habeas-corpus. As acusações são pesadíssimas contra o homem, que mesmo pecador não perde o dom inato que sua existência a ele reservou. Se estuprou, se abusou sexualmente de vítimas fragilizadas, enfermas, desesperadas, desesperançadas, que pague pelos crimes que cometeu. Mas que lhe seja dado o sagrado direito de defesa. Prender para investigar depois, isso não. E mais: muitos dos crimes que as vítimas narram já estão prescritos.

Para encerrar, um fato: certa vez perguntaram a Sobral Pinto: o senhor defenderia um homem que invadiu uma casa, estuprou, roubou e matou mãe e filha?. "Sim, defenderia. Vomitando, mas defenderia. Principalmente para garantir a aplicação da pena, porque investigação, inquérito, processo e julgamento sem dar o direito de defesa ao acusado, tudo é nulo e precisa ser repetido e o acusado posto em liberdade" - respondeu o dr. Sobral Pinto.

Foto de Jorge Béja

Jorge Béja

Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada (UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)

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