Economistas do PT criticam ajuste fiscal

01/10/2015 às 19:06 Ler na área do assinante

A Fundação Perseu Abramo, vinculada ao PT e presidida por Marcio Pochmann, ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, tendo Luiz Gonzaga Belluzo, professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, como principal articular, divulgou um documento criticando o “ajuste fiscal” do governo Dilma defendido por Joaquim Levy, ministro da Fazenda

e preposto dos banqueiros. Pochmann e Belluzo são influentes intelectuais de esquerda e muito próximos ao ex-presidente Lula.

O documento, muito bem estruturado e consistente nas análises e propostas, denominado “Por um Brasil Justo e Democrático”, é composto de dois volumes. O primeiro, com 60 páginas, intitulado “MUDAR PARA SAIR DA CRISE – Alternativas para o Brasil voltar a crescer”; o segundo volume, com 77 páginas, trás o “BRASIL QUE QUEREMOS – Subsídios para um projeto de desenvolvimento nacional”. É um brado contra o neoliberalismo vigente na política econômica brasileira e latino-americana. Diz Pochmann que as premissas da política econômica do ministro da Fazenda estão profundamente erradas e que a Fundação apresenta as soluções apropriadas.

Na linha apregoada por Confúcio de que, para compreender o presente é preciso conhecer o passado, e para saber como será o futuro é preciso conhecer o presente, os economistas fazem uma retrospectiva sobre “a crise da década de oitenta e a experiência neoliberal dos anos de 1990”; discorrem sobre o crescimento econômico e a crise internacional e seus desdobramentos no cenário interno. Finalmente, analisam a crise atual, amplificada pelo “terrorismo” econômico fermentado pelos órgãos de comunicação a serviço das classes dominantes.

A conclusão é que a economia brasileira ficou estagnada por mais de 25 anos, voltando a crescer a partir de 2002, no contexto de uma conjuntura internacional favorável. Fato conhecido de todos, mas sempre renegado nas análises políticas. Entretanto, a crise financeira internacional de 2008, a maior crise do capitalismo desde 1929, alterou o cenário provocando a destruição de riquezas, a paralisação do crédito, a queda dos preços das commodities, a crise do comércio internacional e o acirramento da competição capitalista. Os países periféricos, como é o caso dos latino-americanos, sofreram um pesado impacto negativo. Esse quadro externo, associado aos erros e aos desmandos domésticos, levou o Brasil à crise atual.

É um trabalho precioso e profundo que os governantes (Executivo, Legislativo e Judiciário) deveriam estudar com muita atenção, independente de sigla partidária. E que nós, insignificantes pagadores de impostos e “escolhedores” de poderosas excelências que se perpetuam no poder, deveríamos refletir a respeito. É um documento para ser estudado por todos, principalmente pelos formadores de opinião (jornalistas, professores, profissionais liberais e estudantes).

Sobre o “ajuste fiscal” em andamento, os economistas afirmam que essas reformas conservadoras propostas pelos bancos, fundos de investimentos e demais rentistas, e que estão sendo implantadas pelo governo, destroem as “pontes” que levam ao futuro. Os instrumentos institucionais e financeiros necessários para um projeto de desenvolvimento econômico-social de longo prazo estão sendo desmontados, e não será fácil a sua reconstrução no médio prazo. Relembraram o estrago feito pelo “programa de privatização” dos tempos de FHC na presidência e preservado nos governos seguintes, com pequenas modificações operacionais.

Diz o documento que “o quadriênio (2011/2014) foi marcado pelo agravamento do cenário internacional, com a desaceleração da produção industrial da China, as dificuldades de recuperação das economias europeias e a redução da capacidade de importação de alguns de nossos principais parceiros comerciais na América Latina. Essa situação impactou negativamente os fluxos de comércio e os preços internacionais das commodities e dos produtos manufaturados. As tentativas de retomar o crescimento, preservar o nível de emprego e renda da população, e elevar a competitividade das exportações – que abrangeram, entre outras medidas, a redução das taxas internas de juros, a correção da taxa de câmbio e o expressivo aumento das desonerações fiscais – não produziram os efeitos esperados, o que se traduziu, no final do período, na perda de dinamismo da economia”. Mas é preciso, também, ressaltar a incompetência dos governantes e a ganância dos políticos.

No final do primeiro volume os economistas apresentam, de forma sumária, uma agenda contendo propostas para retirar o país da crise atual e para consolidação de um projeto sustentável de crescimento com inclusão social. Pretendem construir uma “travessia” mais suave e consistente. Para tanto, estruturaram oito propostas básicas que tentarei resumir.

 1. A preservação do emprego e da renda dos trabalhadores é crucial para estancar o retrocesso social e, por consequência, revigorar a arrecadação governamental.

 2. A reversão do quadro recessivo é fundamental, caso se deseje retomar o processo de desenvolvimento no futuro próximo. Não há ajuste fiscal possível em um cenário de recessão e decrescimento das receitas públicas.

 3. Mudanças na institucionalidade do tripé macroeconômico (câmbio flutuante, superávit fiscal e regime de metas de inflação). Para tanto é preciso um novo regime fiscal, estabelecendo-se “bandas” e prazos mais amplos: a) retirar os investimentos do cálculo da meta do superávit primário; b) alterar o ano calendário do Regime de Metas de Inflação; c) calcular a inflação pelo núcleo de preços; d) ampliar o debate sobre as causas da inflação e os instrumentos para combatê-la; e) estabelecer o duplo mandato do banco central: estabilidade de preços e emprego; f) regular o mercado de câmbio.

 4. Baixar os juros porque eles são os responsáveis pelo déficit nominal e pelas rotineiras intervenções do Banco Central no mercado de câmbio, com a venda de swaps cambiais.

 5. Recomposição da capacidade de financiamento do Estado. Para tanto, é preciso: a) revisar a política de renúncias fiscais; b) reorganizar o Estado para combater a sonegação de impostos; c) reformar a estrutura tributária e promover a justiça fiscal, o que significa: Repensar a estrutura do Imposto de Renda da Pessoa Física; Aumentar a alíquota máxima do imposto sobre grandes heranças e doações; Estabelecer imposto sobre grandes fortunas; Tributar lucros e dividendos recebidos por pessoa física; Tributar remessa de lucros para o exterior; Extinguir a isenção de juros sobre o capital próprio; Reformar a legislação do Imposto Territorial Rural.

 6. Destravar os investimentos públicos e privados porque é uma condição fundamental para a recuperação do setor privado brasileiro, que fornece insumos e equipamentos, além de ser gerador de empregos e renda.

 7. Fortalecimento do mercado interno. A combinação de aumento do emprego, formalização e gastos sociais, fortalece o mercado interno de maneira sustentada, aumenta a receita pública e permite a manutenção do processo de transformação social por eles engendrado.

 8. A preservação dos gastos sociais se constitui em importante vetor da demanda agregada. Por seus efeitos multiplicadores, o sistema de proteção social se constitui em instrumento para, simultaneamente, impulsionar o crescimento e reduzir as desigualdades da renda.

São os velhos petistas querendo colocar o partido nos trilhos, apesar do descrédito e da desconfiança de todos. Os economistas esqueceram-se de dizer que para a implantação desse programa proposto é necessário se desfazer do fisiologismo que impera na política brasileira, que é preciso acabar com a corrupção, com o empreguismo no setor público. É fundamental o retorno da meritocracia e a extinção do paternalismo eleitoreiro.

Voltarei ao assunto.

LANDES PEREIRA. Economista com mestrado e doutorado. É professor de Economia Política.

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Landes Pereira

Economista e Professor Universitário. Ex-Secretário de Planejamento da Prefeitura de Campo Grande. Ex-Diretor Financeiro e Comercial da SANESUL. Ex-Diretor Geral do DERSUL (Departamento Estadual de Estradas de Rodagem). Ex-Diretor Presidente da MSGÁS. Ex-Diretor Administrativo-Financeiro e de Relações com os Investidores da SANASA.

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