E agora, como fica a candidatura de Bolsonaro? O que diz a lei?
07/09/2018 às 12:35 Ler na área do assinanteConstatada a gravidade do quadro de saúde do candidato Jair Bolsonaro, menos de vinte e quatro horas depois da facada que sofreu no centro da cidade mineira de Juiz de Fora, já é hora de abordar o que vai acontecer com a sua candidatura. Tudo (ou quase tudo) está previsto nas leis, que são a Constituição Federal, o Código Eleitoral e a Lei 9.504 de 1997 que veio introduzir alterações nas eleições em todo o país.
Mesmo combalido, e até correndo o risco de morte, Bolsonaro continua candidato a presidente da República e nada se altera. A legislação refere-se a duas situações tocantes ao primeiro turno: morte e renúncia.
Pelo Código Eleitoral, se o candidato falecer ou renunciar dentro do período de 60 dias antes do pleito, o partido poderá fazer a substituição até 20 dias antes do dia da eleição. Mas este prazo de 20 dias não vigora mais. A Lei 9.504/97 deferiu a substituição "após esse prazo", o que deixa entender que a substituição poderá ser feita a qualquer tempo e gera também uma indagação: até quando?
É a Constituição Federal (CF) que estabelece a liturgia legal a ser seguida na hipótese da realização do segundo turno se, após o primeiro, ocorrer uma dessas situações: a morte, a desistência e aqui a CF inclui uma terceira circunstância, que é o "impedimento legal de candidato".
Reza a Constituição: "Se, antes de realizado o segundo turno, ocorrer a morte, desistência ou impedimento legal de candidato, convocar-se-á, dentre os remanescentes, o de maior votação" (artigo 77, parágrafo 4º), qualificando-se o mais idoso, caso remanesçam mais de um candidato com a mesma votação (parágrafo 5º do mesmo artigo 77).
A esta altura do pleito, tem-se como "impedimento legal", salvo circunstância(s) outra(s), a interdição do candidato, que com ela perde a sua capacidade civil e sua pessoa passa a ser regida por um curador.
Caso a recuperação do candidato Jair Bolsonaro ultrapasse todos esses prazos e seja ele o eleito, como ele se elege também o seu vice, o general Mourão. Código Eleitoral: "O vice-presidente considerar-se-á eleito em virtude da eleição do presidente com o qual se candidatar" (artigo 211, parágrafo 1º).
Proclamado o resultado pelo TSE e se Bolsonaro-Mourão for a chapa vencedora ambos serão diplomados pelo Tribunal Superior Eleitoral e a Resolução nº 19766/96 do TSE permite o recebimento do diploma por procuração. Ou seja, sendo Bolsonaro o eleito e estando impossibilitado de comparecer à solenidade da entrega do diploma, poderá nomear procurador para este fim.
Já no tocante à posse, aí a situação é outra. A presença dos eleitos (presidente e vice) é indispensável, porque o ato é personalíssimo.
Dispõe o artigo 78 da Constituição Federal que o presidente e o vice tomarão posse em sessão no Congresso Nacional, prestando o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil, tal como expressamente consta na Carta da República.
Mas digamos que Bolsonaro - sendo ele o eleito - não possa comparecer à cerimônia de posse, o que acontecerá?
A resposta está no parágrafo único do mesmo artigo 78 da CF: "Se, decorridos dez dias da data fixada para a posse, o Presidente ou o Vice-Presidente, salvo motivo de força maior, não tiver assumido o cargo, este será declarado vago".
Vamos raciocinar: há no texto constitucional dois pressupostos que são, a ausência do Presidente e do Vice "por motivo de força maior" e a conjunção alternativa OU. Tem-se pois que a presença do vice é suficiente para que o cargo não seja declarado vago e o vice assume, pelo menos até quando o presidente eleito venha ter condições de prestar o compromisso e sentar-se na cadeira presidencial. A outra circunstância, neste caso em que o vice tomou posse perante o Congresso Nacional, é o "motivo de força maior" que atingiria diretamente Jair Bolsonaro, caso eleito mas ainda em tratamento para a recuperação de sua saúde plena. Que está presente "motivo de força maior" ninguém pode negar. E há de perdurar até que o eleito tenha condições para presidir o Brasil ou não tenha. Se, definitivamente, não tiver, o país será então governado pelo vice, tal como aconteceu com José Sarney.
Registre-se que esta análise é feita sem paixões políticas, sem partidarismo, sem ideologia e exclusivamente à luz dos Direitos Constitucional, Eleitoral e Civil. Nada mais além do que isso.
É de se acreditar que o momento já exige a abordagem desse tema, que a mídia ainda não noticiou. E nem se está aqui defendendo a exatidão da análise nem, muito menos, a candidatura de Jair Bolsonaro. Este modesto artigo não passa de mero exercício de raciocínio diante da bestialidade e da covardia que todos nós brasileiros sofremos desde a tarde desta quinta-feira, 6 de Setembro de 2018, na cidade mineira de Juiz de Fora.
Jorge Béja
Advogado no Rio de Janeiro e especialista em Responsabilidade Civil, Pública e Privada (UFRJ e Universidade de Paris, Sorbonne). Membro Efetivo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB)